terça-feira, 25 de outubro de 2022

FAZENDA ESCADINHA – 1862/2022 - Modesto Narra Um Pouco de Seu Histórico

Capela de São José na antiga Fazenda Escadinha

        A antiga Fazenda Escadinha que pertenceu à família importante deste município, e que lá também nasceu o nosso ícone do forró Francisco de Assis Nogueira - o ASSISÃO, neste ano de 2022 completou 160 anos de existência no mais absoluto esquecimento. Quando digo absoluto esquecimento, é porque ela já foi uma das mais ricas fazendas de Serra Talhada. Esses 160 anos refere-se à data do término da construção da capela erguida por Dona Teodora Nogueira, primeira esposa do Dr. Tiburtino Nogueira. Ele, formado na conceituada Faculdade de Direito do Recife, foi uma figura notável naqueles tempos, no meio jurídico de nosso Estado, ocupando inclusive a Promotoria de Justiça, e depois Juiz de direito, na antiga Villa Bela, hoje Serra Talhada.

        O Dr. Tiburtino Barbosa Nogueira nasceu no dia 18 de junho de 1839 e faleceu no dia 6 de junho de 1900 e está sepultado na capela de São José da antiga Fazenda Escadinha. Lá também se encontram os restos mortais de vários membros da família Nogueira. A chamada casa grande que compunha o cenário de esplendor naquela terra a margem direita do Rio Pajeú, só restam hoje em dia fragmentos dos antigos tijolos dos compartimentos, pois a construção centenária era erguida em pau-a-pique e suas divisões, isto é, os quartos e outros cômodos em tijolos. A casa era realmente muito grande.

    Tinha, segundo informações 18 quartos, várias salas, alpendre com calçada, cozinha e outras dependências. Há notícias da existência de uma senzala, pois os donos possuíam mais de uma centena de escravos. A riqueza era enorme. As terras eram o que a vista alcançava. Havia muita criação de bovinos, caprinos, ovinos e muares. Tudo isso foi se acabando a partir dos anos. O grande impacto se deu a partir da libertação dos escravos no ano de 1888. Os escravos desembrearam nas caatingas e os donos foram vendendo tudo, e é como diz o ditado, “de onde se tira e não bota nada, tudo se acaba” e foi isso que aconteceu com a famosa fazenda Escadinha.

Neste local existiu por anos a antiga casa grande da Fazenda

Escadinha atualmente só resta a Capela

    A família da parte do meu pai viveu durante bastante tempo na fazenda. A minha tia Avó foi à zeladora da capela de São José da Escadinha por aproximadamente 50 anos.

    Não existia cemitério na localidade. No entorno da capela foram sepultadas inúmeras crianças. Entre o final dos anos 1960 e início dos anos 1970, foi construído o cemitério e passou-se a sepultar pessoas adultas, lá estão enterrados vários parentes meus.

        O nome da antiga Fazenda Escadinha vem dos vários amontoados de pedras que existem na localidade as quais os mais velhos chamavam de escadinha. Atualmente restam poucos serrotes porque os demais foram destruídos para fazer calçamentos e britas nas construções de casas e etc.

        Avistam-se os três amontoados de pedras que originou o nome dado à fazenda. Existe uma escadinha confeccionada em madeira sobre o altar, mas ela nada tem a ver com o verdadeiro nome da localidade. Aliás, no altar existem várias outras imagens ainda originais. No momento precisando de restauração. Também nas paredes têm quadros alguns originais e outros que foram doados. A minha Avó materna dou um quadro de Nossa Senhora de Fátima, adquirido em sua primeira viagem ao Juazeiro-CE, na década 1960. Faço um destaque a um quadro de São Pedro Apostolo, doado pela minha Tia Avó paterna, porque o original havia sido destruído. Esse quadro está logo na sacristia.

Na antiga Fazenda Escadinha se tem uma das melhores vistas da nossa Serra Talhada. Observa-se o corte perfeito feito ilusão de ótica e da natureza.

O velho sino da capela de São José da Escadinha.

        Existe uma lenda que diz o seguinte: “Moça que bate o sino da Capela da Escadinha não casa”. Eu sou prova que isso não existe. No entanto, a de se considerar e botar “as barbas de molho” como se diz. Lá, até certo tempo, existiam muitas moças que não se casaram. Sei que algumas só viviam badalando o velho sino da capela de São José da Escadinha. A minha Tia Avó Chica Mota, a irmã do meu pai que também se chamava Francisca foram zeladoras daquele pequeno templo e não se casaram. Sei de outras moças que tocaram o sino e se casaram. Então para tudo cabe uma explicação e muitas das vezes sem condizentes com as crenças e lendas, pois para toda regra, há exceções.

        Fazia tempo, que não visitava o meu local de nascimento. Na ocasião desta foto, estava lá em visita o então Secretário Municipal de Desenvolvimento Social – Josenildo André Barbosa, que também nasceu lá, acompanhado da Elis Lopes Garcia que trabalhou como Diretora de Igualdade Racial na Prefeitura Municipal de Serra Talhada em sua gestão como secretário, e fez um trabalho maravilhoso de reconhecimento da nossa negritude. Presto minhas mais sinceras e reconhecidas homenagens a Elis que nos ligou ao nosso passado ancestral.

Modesto Lopes de Barros e Elis Lopes Garcia


Na foto acima Eu e Elis presentes na Conferência de Cultura do Estado de Pernambuco, durante o período que ela passou em Serra Talhada fez amizades com muita gente da nossa terra. É imperioso falar da questão escravatura nessa região do Pajeú que ficou escondida. E o município de Serra Talhada continuou por vários anos não fazendo nada no sentido de reparar os danos perversos que a escravidão causou a população negra. O fato era que pouco se falava dos negros e negras em nosso município. Corria “a boca miúda” que os negros e negras faziam parte das famílias. E eu digo que isso era da cozinha para fora.

Dado ao trabalho iniciado na gestão do Prefeito Luciano Duque hoje sabemos que o município tem uma população Quilombola enorme, pois já são 14 Comunidades reconhecidas e outras tantas ainda não reconhecidas.

Ainda alcancei o altar da capela nas cores branca e azul. No entanto, ele é confeccionado em madeira de lei – cedro. O piso era em tijolo queimado e grande. Havia as marcas das sepulturas das pessoas que foram enterradas ali.

A imagem secular e histórica de São José Padroeiro da Fazenda Escadinha.


        Antigamente as pessoas faziam promessas e quando alcançavam as graças levavam flores, fitas e velas para a capela. Ainda hoje essa tradição é vivenciada pelos fiéis devotos. O São José da Escadinha é um santo milagroso desde sempre, pois a construção da capela foi um milagre alcançado pela Dona Teodora que a mandou construir, por conta de uma graça alcançada.

        Outra tradição que acontecia era o roubo do menino Jesus que está no braço da imagem de São José. Misteriosamente o menino sumia e ninguém sabia quem roubava. Passados alguns meses saia um boato na ribeira falando que a imagem do menino se encontrava na casa de determinada pessoa e nada se comprovava. Eram os alarmes falsos. E nesta pisada os meses se passavam até que finalmente se ficava sabendo da real pessoa que roubou o menino e os motivos. Acho que atualmente esse roubo da imagem do menino Jesus não mais acontece.

        A antiga Fazenda Escadinha era cheia de vida. O povo da minha família por parte do meu pai viveu por vários anos naquela localidade. Durante o mês de março acontecia às celebrações e novenário do Padroeiro. Nos anos secos era comum haver uma procissão com a imagem de São José no último dia da sua festa e o Padre Jesus, que paroquiou Serra Talhada por mais de 50 anos, na sua homilia pedia a interseção de São José para mandar chuva. Muitas vezes presenciei isso. E quando ele terminava seus trabalhos pastorais, como: batizados, confissões, casamentos e missa o tempo mudava e vinha aquela chuva e as plantações seguravam, e o agricultor tirava o milho e o feijão para seu sustento durante o ano. Na verdade, os tempos mudaram e a fé do pequeno agricultor parece que diminuiu.

A emoção ao rever as passagens que marcaram minha infância.

Eu nasci e vivi na Escadinha até os meus cinco anos de vida.


        Na antiga Fazenda Escadinha vivi até os cinco anos de idade. O meu pai fez uma casa na outra margem do Rio Pajeú. A nossa casa ficava perto da serra do Brabo. Lá, ficamos morando de 1952 a 1954. No ano seguinte fomos morar na Fazenda Barrocas do senhor Zé Cunha. Voltando no outro ano para nossa antiga casa, e de lá saímos em 1958. Ano de muita seca e fome. E não voltamos mais para a casa que papai havia construído, e falava que não mais sairia de lá. Ninguém sabe os desígnios de Deus. Tomamos outros rumos e nossa família (pai, mãe, irmãos e eu) nunca mais voltamos naquele lugar chamado Ribeira da Carnaubinha.

        E quanto à antiga Fazenda Escadinha, meu torrão natal, cuja capela completa 160 anos de existência para mim resta saudades. Ainda me lembro da festa que foi realizada nas comemorações de 100 anos da capela. Lá estavam o Sr. Juca Nogueira e a sua esposa Dona Cristina, Dona Maria Nogueira, Sr. Tota Alves. Foi a primeira vez que eu ouvi a palavra – Espanha, pronunciada por Ana Lúcia, filha de Dona Nogueira. Ela falava que ainda faria uma visita à Espanha, terra do Padre Jesus R. Garcia. Tanta gente importante da família Nogueira. A minha Tia Avó Madrinha Chica Mota da Escadinha fez os preparativos da festa, juntamente, com a Tia Chiquinha com esmero. Lembro-me que a preocupação maior delas era com a água. E eu me lembro de que havia mais de 15 potes cheios de água para o povo.

        Concluindo, a Escadinha é o meu lugar. A terra que sempre vai existir nos meus sonhos. Quero nestas minhas lembras externar meus mais sinceros agradecimentos por ter nascido naquela tão abençoada localidade.

        Que as futuras gerações não abandonem a capela de São José da Escadinha que guarda nossa fé em Deus, uma das capelas mais antigas nas fazendas de nosso município – construída no ano de 1862.

Texto e fotos de Modesto de Barros

Ator, Produtor Cultural e dirigente do Centro Dramático de Serra Talhada, 

Ex - Conselheiro Tutelar, Bancário Aposentado, Coordenador do CEU das Artes,

no bairro Caxixola e diretor do Coral Anita Vilarin

segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Saulo Stemell: Um Multi-Artista Serra-talhadense em Ascensão

        Saulo Micharrel da Silva Ferreira é o filho do meio de seu Severino Alves e de dona Simone Silva, que conceberam três herdeiros, porém, seu pai lhe deu mais quatro irmãos de uma segunda união conjugal, totalizando assim sete filhos, Saulo veio à luz em 22 de janeiro de 1997, uma quarta-feira, no Hospital São Francisco em Serra Talhada-PE. Saulo é um nome próprio masculino e significa: “aquele que foi muito desejado”, de origem hebraica, é um nome de forte carga religiosa.
        Saulo Stemell como é artisticamente conhecido, adotou esse nome por achar bonito, chamativo, diferente, o mesmo era usado por uma amiga no perfil do Orkut. O jovem artista passa quase despercebido quando está a paisana, pois é de uma gentileza e humildade que lembra os monges tibetanos, porém ao falar e/ou se caracterizar para apresentações artísticas, você nota imediatamente seus múltiplos talentos: cantor, compositor, dançarino, ator, recreador, maquiador, performer, coreografo, quadrilheiro afamado, toca instrumentos de percussão, e é um apaixonado pelas artes em suas diversas manifestações, além de Influencer digital.
        
"A arte para mim,
é libertadora, é evolvente, é transgressora, nos transforma, e para bem fazê-la nos transformamos por ela, as vezes não estamos bem, aí tem uma apresentação e a gente camufla nosso
mal-estar e fazemos acontecer seja o espetáculo, seja o show, seja a recreação… E por algumas horas aquilo que nos angustiava desaparece. A arte tem esse poder de nos mostrar o extraordinário, a fantasia que nos fascina. É algo divino ser artista, cantar, criar personagens, contar histórias, despertar sensações nas pessoas, principalmente nas crianças, pois são muito verdadeiras se gostarem diz, se não agradar elas demonstram com a mesma verdade, isso é o mais fantástico”
. Se expressa com ar de satisfação e contentamento.        
        Seus estudos
tiveram início nas escolinhas particulares de ensino infantil, Escola Parque e Santa Isabel depois, fez parte do Ensino Fundamental 1 na Escola Methódio de Godoy. Em dezembro de 2011 foi morar com sua irmã Shyrlei na cidade do Recife, onde estudou na Escola Felipe Camarão, retornando para Serra Talhada no ano de 2013, estudou na Escola Irnero Ignácio e concluiu o Ensino Médio na Escola Solidônio Leite em 2018.

        “Sou de família evangélica, então o primeiro talento artístico percebido foi o de cantor quando eu tinha 5 anos, foi algo que surgiu naturalmente, quando menos se espera lá estava eu cantando no coral da Igreja, fazendo solo… A música me acompanha a 2 décadas e é maravilhoso. Comecei como muita gente cantando na Igreja, em conjuntos musicais que tocava e cantava em casamentos, como solista passei a fazer apresentações em outras Igrejas, sempre na perspectiva de evangelizar. Hoje canto estilos variados ao gosto do público para o qual me apresento”. Relata o artista.

        Sua voz é potente, marcante e se adequa a diversos estilos musicais, sua estreia profissional fora da Igreja aconteceu em 2014 na Orquestra Edição Extra, da vizinha cidade de Triunfo, a convite da produtora da banda Ana Cristina, passando a se apresentar em formaturas, festas de aniversários, casamentos e eventos afins, segue atuando na banda sempre que tem show. “Eu canto todos os estilos na Orquestra e nas apresentações solo, porém o forró é o estilo predominante quando me apresento sem a banda, tenho algumas composições autorais e estou me preparando para gravar em breve”. Pondera ele. Para conhecer o lado cantor do artista acesse: Saulo Stemell - YouTube

        Sua formação artística seja na música, na arte de representar, no ciclo junino e demais modalidades é autodidata, vai agindo de acordo com sua intuição, imaginação e criatividade; algo que não lhe falta é inspiração e vontade para realizar com esmero cada uma das inúmeras atividades que lhe chegam. Seu talento para quadrilheiro, é algo perceptível e arrebatador em sua carreira, aparece de forma tímida em 2011 quando passou a acompanhar o lado estilizado das Quadrilhas juninas, admirando, pesquisando e se encantando por este fazer artístico.

        Somente em 2015 integrou o elenco da Junina Flor do Sertão; no ano seguinte (2016), recebeu o convite da Junina estilizada Sem Limite para ser o coreografo e a Rainha daquele ano, o que realizou com notável paixão e afinco. Tanto é, que passou a desenvolver junto aos demais integrantes, argumentação para escolha do tema, coreografias, figurinos e caracterização para cada ciclo junino, levando a Sem Limite a ser destaque nos festivais e concursos de quadrilhas existentes, saindo vencedores em diversas categorias avaliadas pelos jurados.

        Neste ano de 2022 arrebataram vários troféus e levaram o nome de Serra Talhada com muito talento, brilho e uma pitada de ousadia para muitas cidades pernambucanas, além de outros Estados do Nordeste. “Já havia me montado algumas vezes, porém a personagem não tinha nome para ser chamada, então, resolvi unir as siglas de trás para frente do meu nome e sobrenome compondo assim, Medley Sabrina que aparece nos concursos de miss e no ciclo junino, sempre com destaque”. Conclui Stemell.

        Sem perder a simplicidade, sua marca registrada, o multi-artista vai buscando referências e se aprimorando enquanto autodidata, mas tendo oportunidade participa de cursos e oficinas como aconteceu em 2018, quando fez com esmero o Curso ACUPE Formação do Intérprete-Pesquisador em Dança 2018. “Esse curso foi absolutamente importante na minha trajetória, pois nos apresentou ferramentas de investigação acerca de nossas possibilidades de diálogo estético com o mundo na linguagem da dança, foram seis disciplinas na grade de atividades: Danças Tradicionais, Ballet Clássico, Dança Contemporânea, Teatro/performance, Pesquisa em Dança/Demonstração de Trabalho e dança inclusiva, algo realmente marcante para mim”. Relembra.

        Hoje o genial artista se desdobra entre os trabalhos de recreação e personagens infantis na Tindolelê, ensaios e apresentações na Orquestra Edição Extra e na Junina Sem Limite, Voz e Violão, participação em shows de outros artistas como convidado, presença em eventos com a Medley, vida pessoal e familiar. “O artista tem que fazer várias coisas ao mesmo tempo para conseguir sobreviver, espero o tempo em que a arte seja mais valorizada e a gente ganhe mais trabalhando menos, atualmente os corres são muitos para se conseguir o mínimo. Todavia me sinto realizado em fazer o que gosto”. Finaliza sorridente.




Por Carlos Sett